Confiante no objetivo, Lupi antecipou ao Correio que pretende assinar convênios para simplificar a concessão de benefícios como o de invalidez, que poderá ser concedido mediante atestado de um médico do SUS, sem perícia do INSS.
Sobre a crise no crédito consignado, ele aponta que a iniciativa do ministério conseguiu reduzir os juros desses empréstimos e insiste que ainda havia margem para um corte maior, como proposto inicialmente, mas não sabe o motivo da falta de apoio do Banco do Brasil e da Caixa. Confira os principais pontos da entrevista do ministro:
O que foi apresentado nos primeiros 100 dias?
Nós não apresentamos nada, quem apresentou foi o presidente Lula. Na área da Previdência, um fato muito importante foi o fim da prova de vida, logo nos primeiros 15 dias. Havia a exigência de o segurado ir ao banco para provar que está vivo e, assim, poder continuar recebendo o benefício. Isso era um absurdo, porque, se eu morrer amanhã, isso será registrado no cartório, e já existem convênios e acordos de cooperação técnica que fazem a informação ser automaticamente enviada ao INSS. Também estamos retomando toda a organização do Ministério da Previdência. Pegamos uma terra arrasada e uma fila imensa. Eu vou anunciar a organização dessa fila, como é composta, por setor, por tempo, tudo discriminado, para, até o fim do ano, ter uma equação melhor da que temos hoje.
Como vai ser essa organização?
Lembra do Caged, que eu fazia lá no (Ministério do) Trabalho? Vou fazer aqui o Cageb, o Cadastro Geral dos Benefícios, organizar a fila, fazer uma fotografia. Tem pessoas que estão aguardando perícia há 45 dias, que é muito tempo, mas tem alguns que aguardam há mais de um ano, aí já é extrapolar...
Como vai ser priorizada a fila?
Pelo tempo e pelas exigências, porque, conforme o tipo de fila em que você está esperando, tem um tipo de demanda, que vai desde a falta de documentação. Então, vai depender muito da demanda e do tempo para a gente colocar essa fila em um patamar razoável. Para mim é razoável, não bom, até 45 dias.
Até a concessão da aposentadoria?
Não é só aposentadoria, todo o tipo de benefício. Tem aposentadoria, tem pensão, tem salário maternidade, salário doença, benefício de prestação continuada (BPC), que depende da perícia, seguro defeso, tem vários tipos de benefício. Nossa intenção é organizar esses dados e mostrar, claramente, o que é de cada um.
Isso traz impacto no orçamento?
De imediato, não tem um impacto maior, quer dizer, sempre tem algum impacto, porque você sempre está aumentando o número de aposentados. Para se ter uma ideia, nós tínhamos uma demanda média por mês, até o ano passado, de 620 mil pessoas entrando com algum pedido no INSS. Em março último, passou de 900 mil. A Previdência, hoje, despende R$ 60 bilhões por mês com todos os benefícios pagos. Este ano, eu posso te afirmar que a Previdência terá um orçamento de 720 bilhões.
A Previdência teve mais agilidade no período eleitoral?
Isso é uma coisa que a gente ouviu especificamente quanto ao BPC. Tem vários tipos de benefícios da Previdência. Aposentadoria e pensão são os principais pedidos e dependem exclusivamente do INSS, mas são 10 ou 11 tipos.
Quais são?
Tem aqueles que não dependem exclusivamente do INSS, como o Benefício da Prestação Continuada. O BPC depende da Previdência e do Ministério de Desenvolvimento Social (MDS), que faz o primeiro exame da condição social do cidadão para saber se ele pode receber. Tem o Ministério do Desenvolvimento Agrário, porque todo trabalhador agrícola, na Constituinte (1988), passou a ter direito a aposentadoria. Importante dizer que tanto o deficiente como o trabalhador agrícola, 90% deles não foram contribuintes da Previdência. Na verdade, são benefícios sociais bancados pelo Orçamento Geral da União, mas são colocados como despesa contábil da Previdência. No caso dos agricultores, quem atesta que eles são trabalhadores do campo, e o tempo de trabalho, é o MDA. Depois de passar pelo MDA, vem para a Previdência para fazer um novo exame.
Um caminho longo, então?
Em primeira mão, te digo que estamos organizando quatro acordos de cooperação técnica. No MDS, a assistência social, que faz a entrevista com o beneficiário da prestação continuada do deficiente, se atestar no cadastro único, vai valer para a Previdência. Por que fazer uma segunda confirmação se um órgão público já está atestando isso? Já no MDA está andando um acordo com essa mesma intenção, que vai atestar a condição e o tempo do agricultor para ele poder se aposentar. Validado pelo MDA, vai valer para mim. E também estamos fazendo um acordo com o Ministério da Saúde, para criar o AtestaMed: com um atestado de um médico do SUS, não vou ter que fazer uma perícia para atestar um acidente. Tudo está em fase de construção, mas o que for atestado no Ministério da Saúde vai ter validade na Previdência. Todas essas ações implicam diminuir a fila.
E o quarto convênio?
É para o defeso, com a Marinha, que dá o atestado para os barcos. Se eu tenho a informação que está tudo cadastrado, eu não preciso fazer um novo cadastro para saber quem é o pescador ou não do seguro defeso. Até o fim deste mês (abril), será a formalização. Isso vai diminuir o impacto do trabalho. Só esse mês, foram 920 mil pedidos, se eu conto com o MDS, com o MDA, com a Saúde, e com a Marinha, vai diminuir muito a demanda mensal, e eu coloco nosso pessoal para trabalhar na fila das demandas represadas.
Isso resolve a fila?
Outra coisa que vamos fazer é um mutirão com um bônus (para o servidor). Em janeiro, fevereiro e março eu não consegui, mas está para sair uma medida provisória do presidente até o fim do mês. Esse mutirão é só para a fila, só para esses 1,8 milhão de pedidos represados.
Quando vai zerar a fila?
Não, não existe fila zerada, existe prazo aceitável de fila, e até dezembro eu quero ter um prazo aceitável de espera. Qual é esse prazo? Hoje, pela lei, seria 45 dias o prazo máximo, mas para mim é muita coisa, quero ficar abaixo desses 45 dias, até dezembro deste ano, para todos.
O governo conseguiu articulação no Congresso?
Qual a votação no Congresso que foi feita para testar isso? Só teve uma coisa, até antes da posse do presidente Lula, que foi a liberação do teto de gastos dos recursos para os programas sociais, como o Bolsa Família. Agora que está se começando a examinar as medidas provisórias, porque estava um conflito entre o presidente do Senado e o presidente da Câmara. O que o governo poderia fazer?
O impasse no Congresso e as declarações do presidente sobre o senador Moro não desgastam o governo?
Concordo integralmente com o presidente Lula: o Moro é um algoz da democracia. É um homem que era um justiceiro da velha república, que depois de, entre aspas, fazer a justiça em que ele acreditava, ocupou um cargo de ministro do governo que ele ajudou a eleger. O presidente está coberto de razão.
O presidente não exagerou com o senador?
Acho que ele foi moderado. Em qualquer país democrático, o Moro estaria na prisão. É a minha opinião. Acho que ele foi um homem que fez tudo ao arrepio da lei. Agora, ele é um senador da República, e em uma democracia, nós temos que respeitar a sua atuação como senador, mas, como juiz, ele não merece respeito, são coisas diferentes.
O senhor falou de uma antirreforma da Previdência?
Eu falei uma vez, no dia da minha posse, é uma consideração minha, e continuo com a mesma opinião. Eu falei que o assunto teria que ser debatido dentro do Conselho Nacional da Previdência e que, depois, levaríamos aos órgãos competentes do governo. O tempo de vida de um brasileiro que mora no Nordeste é diferente do tempo de vida de um brasileiro que mora no Sul. Isso tem que ser regionalizado.
E como fecha a conta?
A conta fecha com o governo começando a olhar que nós temos o maior programa social das Américas. Eu trabalho para 37 milhões e 600 mil brasileiros que sobrevivem e recebem da Previdência. Dos municípios brasileiros, 60% só sobrevivem por causa do dinheiro dos aposentados e pensionistas que circula, recebem mais dinheiro da Previdência do que do Fundo de Participação dos Municípios. Existe algum programa que bote mais distribuição de renda real, com tanta força como a Previdência Social? Eu não conheço. E, mesmo assim, todo o aposentado e pensionista acha que está ganhando mal.
E não está?
Eu acho que está, mas isso não se corrige assim, estamos agora dando pela primeira vez aumento real. É pouco, mas estamos dando aumento real. Tanto para o salário-mínimo quanto para o aposentado e pensionista. No ano de 2022, o Bolsonaro pagou em torno de R$ 300 bilhões em serviço de juros da dívida interna e externa, e a Previdência pagou em torno de R$ 300 bilhões em pensões e aposentadorias. O que é mais importante, você ajudar com esses recursos 1.000 brasileiros, ou você ajudar 37,6 milhões que recebem da Previdência? Eu não estou aqui fazendo apologia de não se pagar juros, de não se pagar dívida, estou dizendo que essa comparação precisa ser feita.
A reforma atingiu menos os militares, está certo?
Em uma democracia, isso tem que ser discutido. Eu acho que tem uma diferença do setor civil para o militar, já que qualquer civil celetista tem um Fundo de Garantia, e os militares não têm. Para isso, tem o Conselho Nacional da Previdência, depois vai para a Fazenda examinar e termina com a Casa Civil fazendo seu parecer final.
Isso já foi discutido no Conselho?
Ainda não começou porque só houve duas reuniões do Conselho, uma para reduzir a taxa de juros do consignado, e outra para corrigir, adequar, essa taxa de juros.
A primeira reunião repercutiu bastante...
Foi bom para a sociedade, porque se deu luz para algo que ninguém discutia. Alguma vez se discutiu a taxa de juros para aposentados e pensionistas? Estamos falando de 8 a 9 milhões de brasileiros que estão com algum empréstimo consignado.
O presidente reclamou do senhor quando falou de ministros geniosos?
O presidente falou dos ministros geniais, e nem falou para mim, foi pura pimenta que colocaram. Na véspera daquele dia, outro companheiro nosso, que não estava na reunião, havia falado de um tema e foi citado isso, 'o fulano vem com ideias geniais'. Na mesma reunião, falei da questão da Previdência, falei dos consignados na frente do presidente e mais 17 ministros da área. Você viu algum dia o presidente falar que não tinha falado comigo antes? Essa do gênio não tinha nada a ver comigo, foi antes do consignado, mas quiseram botar na minha conta. Mas não é meu papel trabalhar na intriga, até porque está tudo em paz.
E o recuo no consignado?
Eu gostaria que não tivesse que diminuir, mas o tempo vai mostrar. Todos os grandes bancos estão cobrando taxas abaixo de 1,9%, por isso, acho que foi muito útil essa discussão. Quando o presidente do Conselho era o Ônix Lorenzoni, a taxa do teto era 1,8%, e passou para 2,14% com uma resolução que apontava que a taxa mínima era de 1,25%. A partir dessa taxa, o sistema de consignados do INSS já dava lucro, eles aumentaram na época de 1,8% para 2,14%, porque a inflação era de 10,45%. Agora, a inflação caiu para 5,40%, mas o mesmo cálculo usado para subir, agora, para cair para 1,7%, não serve, era abuso e demagogia.
E por que os bancos públicos não embarcaram?
Aí tem que perguntar ao Banco do Brasil e à Caixa Econômica. Eu não sei, foi uma surpresa para mim, pergunte a eles.
Fonte: Correio Braziliense
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